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O ENTARDECER

O ENTARDECER

MÁ SINA A NOSSA

 

Será por simples acaso? Veremos:

Oficialmente a 1ª bancarrota ocorreu em 1560 durante a regência da viúva de D. João III e a última, no final da monarquia, acabou com uma reestruturação da dívida soberana cuja negociação durou 10 anos. Na realidade, podem-se contabilizar 8: 1560, 1605, 1834, 1837, 1840, 1846, 1852 e 1892, ou seja, a maioria já no século XIX.

No entanto, o campeão das bancarrotas foi Espanha, com 12 episódios, concentrados na dinastia filipina e durante o século XIX.

1892-1902: A longa reestruturação da dívida soberana no final da Monarquia

A famosa revista inglesa The Economist andava a avisar desde 1880: "Os mercados monetários da Europa estão a ficar cansados, e não sem razão, da constante solicitação por Portugal de novos empréstimos", escrevia em 27/11/1880. E em 1885: "No próprio interesse de Portugal era preferível que as suas facilidades de endividamento fossem, agora, restringidas".

Rebentou então uma crise financeira mundial, com o epicentro na City londrina, iniciada em 1890 com a falência do banco Baring Brothers que contagiaria Portugal por vários canais, incluindo via Brasil. O próprio Baring era o principal parceiro do governo português na City e, na aflição, reembolsou-se em 1 milhão de libras em Lisboa, o que levou a uma redução significativa das reservas em ouro do Banco de Portugal. Em 1888, no Fenn's Compendium, Portugal já tinha sido considerado como um país de alto risco. Com a contracção dos mercados de capitais internacionais, durante a crise financeira mundial de 1890-1893, o ecossistema financista português desabou. Juntou-se o esboroamento do padrão-ouro que havia sido adoptado em 1854. Finalmente, viveu-se uma crise política aguda que misturaria o efeito dos problemas geopolíticos em África - com o ultimatum sobre o mapa cor-de-rosa por parte da Grã-Bretanha - com a ascensão do movimento republicano (revolta no Porto em 31 de Janeiro de 1891) e das lutas dentro dos partidos monárquicos.

 

A balança de pagamentos acaba por ter um défice gigante em 1891, depois de um período em que acumulara excedentes. A dívida total (externa e interna) que andava pelos 24 milhões de libras em 1858 disparou para 127 mil milhões de libras. Apesar da pobreza do país, era a 2ª maior da Europa per capita, depois da França.

A revista inglesa, de novo, escrevia: "Tem sido evidente de há bastante tempo que o país estava a viver acima dos seus meios. Mais tarde ou mais cedo era inevitável que acabasse em bancarrota - e foi à bancarrota que Portugal agora chegou" (6/2/1892). E acrescentava: "É inevitável uma redução significativa do encargo com a dívida, que absorve quase metade da receita total. Os detentores da dívida portuguesa têm de consentir num abatimento dos seus direitos, por força das circunstâncias". Os ingleses aconselhavam mesmo: "Se Portugal abordar os seus credores leal e francamente nestas linhas ser-lhe-á relativamente fácil efectuar um acordo razoável com eles".

A solução acabaria por ser imposta por decreto. Os credores externos não aceitaram o curso forçado do papel-moeda emitido pelo Banco de Portugal. O default parcial acabaria por acontecer em Junho de 1892. O governo teve de suspender parcialmente os encargos altos da dívida. Em Paris, os credores ficaram surpresos com a redução das taxas de juro em 66%. O objectivo último acabaria por ser a reestruturação e reescalonamento dos pagamentos.

Julgava-se que no final do convénio de 1902 com os credores se obteriam novos empréstimos - mas isso não aconteceu. A dívida seria convertida num novo empréstimo amortizável a 99 anos, até 2001.

O efeito de afastamento dos mercados financeiros internacionais não seria muito prejudicial para a economia real, que dependia sobretudo do comércio com o Brasil, as colónias em África e o Reino Unido. Os principais credores financeiros da dívida estavam em Paris e em Berlim. A economia portuguesa acabaria por recuperar relativamente bem.

Fonte: Expresso

 

 

A HISTÓRIA PODE DAR-NOS CONSELHOS

 

Portugal 120 anos depois da bancarrota de 1892

Não é a primeira vez que Portugal se vê nestas alhadas de ter que declarar bancarrota e socorrer-se da ajuda externa. Em 1892 o país teve que estender a mão e declarar uma bancarrota parcial numa crise que se arrastou por mais de 10 anos.

A implementação da República no Brasil em 1889 e a crise do Banco Barings inglês colocou as finanças portuguesas num ponto quase caótico. Portugal começou a recorrer ao empréstimo estrangeiro para assegurar o pagamento do coupon da dívida (e com isso endividando-se mais) mas sem sucesso. Então optou-se por um estratagema de vender a exploração de tabaco por 15 anos perante uma determinada “renda”. A verba anual de 4250 contos foi uma pequena esmola em 1891 e após vários ministros da fazenda que se foram demitindo por impossibilidade de tirar o país do buraco, o ministro da fazenda Oliveira Martins apresentou um orçamento ao parlamento a 13 de Fevereiro de 1892. Neste orçamento propunha um aumento da tributação dos títulos de dívida pública para 30%, dos impostos sobre os ordenados dos funcionários públicos e das corporações administrativas para 12,5%, 15% às contribuições predial, industrial e sumptuária, e 12,6% sobre os rendimentos de rendas de casas. No entanto a comissão da Fazenda limitou estes aumentos de impostos e o ministro demitiu-se em Maio.

A 13 de Junho de 1892 o estado anunciou oficialmente a impossibilidade de pagar os juros da dívida pública e a bancarrota foi declarada e a crise política instalou-se até pelo menos o convénio de 1902 e eventualmente até à implantação da república (18 anos).

No meio desta crise um dos projectos adiados de Portugal foi o do metro de Lisboa. As capitais do mundo estavam neste momento a construir os seus metropolitanos. Londres em 1863 foi a primeira, Nova Iorque seguiu-se em 1868, Budapeste e Glasgow em 1897 e Paris em 1898. Em Lisboa a ideia de um metro foi discutida em 1885 por proposta dos engenheiros Costa Lima e Benjamim Cabral. Em 1888 o engenheiro militar Henrique da Lima e Cunha apresentou um projecto à associação de engenharia portuguesa intitulado “Esboço de traçado de um Caminho de Ferro Metropolitano em Lisboa”. Nada disto pode ir avante e foi preciso esperar por 1949 (quase 60 anos) para que o projecto renascesse e foram precisos mais 10 para que no final de 1959 finalmente o metro abrisse as portas com 6,5Km e 11 estações.

A história ensina muito a quem estiver disposto a olhar para ela com cuidado. É fácil ver nesta descrição semelhanças gritantes com algumas coisas que ocorreram nos últimos tempos em Portugal. Desde os projectos megalómanos em que insistimos, aos aumentos de impostos, às demissões e oposições, é possível ver que os tempos que se aproximam não serão fáceis. Infelizmente penso que a crise será longa à semelhança da que aconteceu há 120 anos, o que não quer dizer que tenhamos que ser miserabilistas ou pessimistas sobre o nosso futuro. Os tempos futuros serão de crise, de sacrifícios por vezes até extremos. A história pode dar-nos pistas e também mostrar os erros que fizemos para não os repetir. Infelizmente acho que alguns políticos dormiam nas aulas de história.

 

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