A GRANDE UTOPIA
Se o socialismo substituiu o liberalismo como a doutrina da grande maioria dos progressistas, isso não significa, apenas, que as pessoas tenham esquecido as advertências dos grandes pensadores liberais sobre as consequências do colectivismo.
Quase não ocorre hoje que o socialismo era, de início, francamente autoritário. No que se referia à liberdade, os fundadores do socialismo não escondiam as suas intenções. Eles consideravam a liberdade de pensamento, a origem de todos os males da sociedade do século XIX, e o primeiro dos planeadores modernos, Saint-Simon, chegou a predizer que aqueles que não obedecessem às comissões de planeamento por ele propostas seriam "tratados como gado".
Tocqueville, mais do que ninguém, percebeu que a democracia, como instituição essencialmente individualista, entrava em contradição frontal com o socialismo. Segundo ele, "democracia e socialismo nada têm em comum excepto uma palavra: igualdade". Mas, advertia o próprio Tocqueville que "enquanto a democracia procura a igualdade na liberdade, o socialismo procura a igualdade na repressão e na servidão".
O advento do socialismo seria um salto do reino da necessidade para o reino da liberdade. É importante perceber a subtil alteração do sentido a que se submeteu a palavra liberdade para tornar plausível esse argumento. Para que o homem pudesse ser verdadeiramente livre, o "despotismo da necessidade material " deveria ser vencido, e atenuadas "as restrições decorrentes do sistema económico". Liberdade nesse sentido não passa, é claro, de um sinónimo de poder ou riqueza. A reivindicação da nova liberdade não passava, assim, da velha reivindicação de uma distribuição equitativa da riqueza. Mas o novo rótulo forneceu aos socialistas mais uma palavra em comum com os liberais, e eles a exploraram ao máximo, a despeito do novo sentido dado àquela palavra.
A promessa de maior liberdade tornou-se uma das armas mais eficazes da propaganda socialista. Foi, Inquestionavelmente, a promessa de maior liberdade que atraiu um número crescente de liberais para o socialismo e que os tornou incapazes de perceber o conflito existente entre os princípios do socialismo e os do liberalismo. O socialismo foi aceite pela maior parte da intelligentsia como o herdeiro aparente da tradição liberal. Nos últimos anos, porém, esse erro foi-se tornando claro. Foi-se tornando clara a extraordinária semelhança, em muitos aspectos, das condições de vida nos regimes fascista e comunista.
Enquanto para muitos, que observaram de perto a transição do socialismo para o fascismo, a relação entre os dois sistemas, ficou cada vez mais evidente, na Inglaterra a maioria ainda acredita que o socialismo e liberdade ainda podem ser conciliados.
O socialismo democrático, a grande utopia das últimas gerações, não só é irrealizável, mas o próprio esforço, necessário para concretizá-lo gera algo tão inteiramente diverso, que poucos dos que agora o desejam estariam dispostos a aceitar as suas consequências.