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O ENTARDECER

O ENTARDECER

Aos Milhões de Reformados Espoliados

Com base num bom concelho de um senhor chamado Fernando Dacosta,  lido num artigo colhido nos jornais, este senhor faz um elogio ao General Ramalho Eanes que, por inteiro, merece um aplauso de todos os portugueses bem formados. Façamos também nós correr por todos os reformados, a quem quiseram tirar e tiraram uma larga fatia de uma pequena reforma, que lhes pertencia por direito absoluto. Embora, não recebam o seu sustento por duas ou mais origens, mas somente por uma  reforma, altamente reduzida. Acreditando-se que de forma "inconstitucional e imoral"

Voltando a Eanes, quando cumpria o seu segundo mandato, Ramalho Eanes viu ser-lhe apresentada pelo Governo uma lei especialmente congeminada contra si.

O texto impedia que o vencimento do Chefe do Estado fosse «acumulado com quaisquer pensões de reforma ou de sobrevivência» públicas que viesse a receber.

Sem hesitar, o visado promulgou-o, impedindo-se de auferir a aposentação de militar para a qual descontara durante toda a carreira.

O desconforto de tamanha injustiça levou-o, mais tarde, a entregar o caso aos tribunais que, há pouco, se pronunciaram a seu favor.

Como consequência, foram-lhe disponibilizadas as importâncias não pagas durante catorze anos, com retroactivos, num total de um milhão e trezentos mil euros.

Sem de novo hesitar, o beneficiado decidiu, porém, prescindir do benefício, que o não era pois tratava-se do cumprimento de direitos escamoteados - e não aceitou o dinheiro.

Num país dobrado à pedincha, ao suborno, à corrupção, ao embuste, à traficância, à ganância, Ramalho Eanes ergueu-se e, altivo, desferiu uma esplendorosa bofetada de luva branca no videirismo, no arranjismo que o imergem, e nos imergem por todos os lados.

As pessoas de bem logo o olharam empolgadas: o seu gesto era-lhes uma luz de conforto, de ânimo em altura de extrema pungência cívica, de dolorosíssimo abandono social.

Antes dele só Natália Correia havia tido comportamento afim, quando se negou a subscrever um pedido de pensão por mérito intelectual que a secretaria da Cultura (sob a responsabilidade de Pedro Santana Lopes) acordara, ante a difícil situação económica da escritora, atribuir-lhe. «Não, não peço. Se o Estado português entender que a mereço», justificar-se-ia, «agradeço-a e aceito-a.

Mas pedi-la, não. Nunca!»

O silêncio caído sobre o gesto de Eanes (deveria, pelo seu simbolismo, ter aberto telejornais e primeiras páginas de periódicos) explica-se pela nossa recalcada má consciência que não suporta, de tão hipócrita, o espelho de semelhantes comportamentos.

“A política tem de ser feita respeitando uma moral, a moral da responsabilidade e, se possível, a moral da convicção”, dirá. Torna-se indispensável “preservar alguns dos valores de outrora, mesmo das “utopias” de outrora”. Utopias que levaram a entregar a milhares uma reforma para a qual nunca descontaram! Outros, muitos milhares, conseguiram reformar-se com insignificantes descontos! Os trabalhadores da sociedade civil e a sua entidade patronal, descontaram mais de trinta anos + ou - 30% do seu vencimento, mensalmente!

António Reis Luz

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